O impacto do distanciamento social no achatamento da curva de infectados em Porto Alegre
Seguindo as análises da progressão do #coronavirus feitas no nosso monitoramento de cidades brasileiras, hoje iremos olhar especificamente para Porto Alegre.
Observamos que a cidade de Porto Alegre, até o momento, teve sucesso na contenção do avanço do vírus e estabilização dos internados em leitos de UTI para pacientes com COVID-19: até dia 3 de maio, em relação à outras capitais brasileiras, a capital apresentava a 6ª menor taxa de casos por habitantes (31 casos por 100 mil habitantes) e a 15ª menor taxa de letalidade (3,5%) sobre todos os casos confirmados com COVID-19. No dia 6 de maio, a taxa de casos estava em 32 casos por 100 mil habitantes e 1 morto a cada 100 mil habitantes (estudo completo disponível aqui).
A capital tem adotado várias medidas de contenção ao COVID-19 desde o início da chegada do vírus, sendo que uma delas foi o fechamento de alguns setores da cidade, indo desde a interdição de parques, suspensão de aulas, fechamento de estabelecimentos comerciais, cancelamento de todos os eventos, até a proibição do funcionamento de restaurantes e bares. Recentemente, foram adotadas medidas para reabrir setores industriais e outros.
Dois indicativos de que essas medidas de contenção contra a propagação do vírus tiveram sucesso são: o freamento no crescimento exponencial dos total de casos na cidade e a estabilização dos pacientes internados em UTI com COVID-19. Nos gráficos abaixo podemos observar todas as medidas de fechamento de serviços da cidade (retas verticais em vermelho) que foram adotadas e as medidas recentes de abertura (retas verticais em verde) comparadas com a quantidade total de casos, em escala logarítmica, e com os casos de internados em UTI com COVID-19 respectivamente:
Como sabemos, o comportamento inicial de uma epidemia é que o crescimento de casos ocorra de forma exponencial. Quando colocamos esses dados em escala logarítmica, o crescimento exponencial se torna um crescimento linear. Assim, no primeiro gráfico observamos o crescimento exponencial inicial dos casos do vírus em Porto Alegre até próximo do dia 26 de março, 10 dias após as primeiras medidas. A partir desta data, o crescimento exponencial é freado, demonstrando o impacto das medidas de distanciamento social.
O impacto do freamento do crescimento exponencial dos casos no sistema de saúde das UTIs de Porto Alegre também pode ser observado no segundo gráfico. Como esperado, conforme os modelos de epidemiologicos, o decrescimento de casos em UTI deve acontecer com um certo atraso em relação ao decrescimento de novos casos de infecções. A partir do dia 10 de abril, vemos o início da queda e estabilização dos casos de internados em UTI com COVID-19, quase 1 mês após o início das medidas de contenção adotadas pelo município.
Diante dessa situação, nos perguntamos: o que aconteceria se não houvesse a implementação de medidas de distanciamento social?
Utilizando o modelo SEIR, foi possível estudar e modelar como seria a progressão do vírus em Porto Alegre, caso não houvesse medidas de distanciamento social, e comparar com o cenário atual da cidade.
Inicialmente, foram considerados dois cenários para a modelagem: o primeiro é o estágio inicial da propagação da epidemia com crescimento exponencial e nenhum distanciamento social, enquanto que no segundo há medidas de contenção e distanciamento social para reduzir a propagação do vírus e achatar a curva de infectados. Ambos cenários estão demonstrados nos gráficos abaixo:
Na primeira imagem observamos a modelagem da quantidade total de casos. No modelo, os casos graves são aqueles que necessitam de internação hospitalar (dado não disponibilizado no boletim de Porto Alegre) e os casos críticos necessitam de internação em UTIs (disponível nos boletins da cidade).
A curva azul mostra o crescimento do vírus sem nenhum distanciamento social ou medida de contenção. Nela, já teríamos ultrapassado 4 mil infectados graves + críticos e o sistema de saúde estaria próximo do colapso. Para lidar com o crescimento dessa curva, precisaríamos de cerca 30 mil leitos hospitalares e de 8 mil leitos de UTI no pico da propagação do vírus, sendo que, no total, Porto Alegre possui 6508 leitos hospitalares adultos e disponibiliza atualmente 108 leitos de UTI para COVID-19, número que pode ser incrementado progressivamente.
A curva vermelha mostra a situação atual do crescimento do vírus, que está controlada e tende a decrescer se as medidas de contenção continuarem sendo adotadas. Se a curva vermelha se mantiver, devemos estar alcançando o auge da infecção no momento e não precisaremos ampliar o sistema de saúde.
Já a segunda imagem mostra a modelagem de óbitos por COVID-19. Sem nenhuma contenção, na curva azul, estaríamos ultrapassando 100 mortos por conta do vírus, sendo que, atualmente, a cidade possui apenas 17 mortos confirmados.
Com esses dados e simulações, podemos observar o sucesso na contenção do avanço do vírus e achatamento da curva de infectados em Porto Alegre, sendo que, atualmente, a cidade vive um cenário estável com relação aos pacientes internados em UTI e a quantidade de mortos deve se estabilizar junto com o decrescimento da curva de infectados.
Diante desse cenário de sucesso temporário e estabilidade da curva de infectados, o governo estadual e a gestão municipal estudam com cuidado a reabertura de setores da economia e a ampliação de testes na cidade. Tendo isso em vista, no próximo post, traremos uma simulação de redução e aumento do distanciamento social em Porto Alegre, onde mostraremos em quais cenários o achatamento da curva de infectados pode ser realizado com sucesso e iremos também comparar com situações em que uma pequena diminuição das medidas de distanciamento social levam ao crescimento desenfreado do número de casos e ao colapso do sistema de saúde.
Conforme explicado em um post anterior, estamos utilizando o modelo SEIR para estudar uma possível modelagem da progressão do COVID-19 em algumas cidades brasileiras. Porto Alegre foi uma das cidades onde o modelo melhor se adaptou à progressão do vírus e por isso foi priorizada para essa análise.
Outras referências:
Sistema de UTI: