Os impactos sociais da COVID-19

Após 8 meses de pandemia, mais de 30 milhões de casos e 1 milhão de óbitos, é inegável que a COVID-19 esteja causando um impacto gigante no mundo inteiro. Além dos efeitos sanitários, o distanciamento social e a interrupção de atividades econômicas estão causando inúmeros prejuízos indiretos, desde perdas financeiras até danos para a saúde mental e física da população. Assim, no post de hoje, vamos analisar os impactos da COVID-19 no mundo até o momento, tanto em termos das questões econômicas e suas consequências, quanto em termos de saúde e educação, com enfoque especial na população infantil.


ECONOMIA: POBREZA, FOME E TRABALHO

O impacto econômico da COVID-19 já é muito alto: estamos enfrentando a maior recessão desde a 2ª Guerra Mundial. E as perspectivas não são promissoras: a economia não deve voltar ao normal até o fim da pandemia, e as projeções do FMI indicam que a economia global deve perder ao menos 12 trilhões de dólares até o final de 2021. Essas dificuldades econômicas estão refletindo diretamente na população: a tendência de 20 anos de queda na pobreza extrema mundial sofreu um revés em 2020, com um aumento de 7% nos últimos meses. Mais de 37 milhões de pessoas passaram para baixo da linha de pobreza extrema (1,9 dólares por dia) e mais de 68 milhões já ultrapassaram a linha de pobreza (3,2 dólares por dia) - número que pode seguir em crescimento e afetar 135 milhões de pessoas até 2030.

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Um dos reflexos do impacto econômico e do aumento da pobreza é o aumento da fome no mundo. Estimativas da Nações Unidas indicam que o número de pessoas em situação de insegurança alimentar em níveis que oferecem risco de vida deve quase dobrar esse ano, alcançando 265 milhões de pessoas. Dentre a população com menos de 5 anos de idade, o número de crianças com síndrome consumptiva (um estado de má nutrição aguda que provoca perda involuntária de peso e um risco elevado de morte e de desenvolvimento de problemas de saúde a longo prazo) deve aumentar em 7 milhões, cerca de 14%.

Os impactos econômicos estão afetando minorias de forma mais grave: nos EUA, 23% dos americanos não tinham certeza se poderiam pagar aluguel no última mês, mas esse número era duas vezes maior entre a população latino-americana e preta. Na África, as mulheres estão sofrendo mais com a pobreza causada pela pandemia do que os homens: os ganhos de trabalhadores informais caíram mais de 80% no primeiro mês de pandemia e a maioria das mulheres em países de média e baixa renda trabalham nesse setor. Em termos de insegurança alimentar, a maior parte da população em situação de vulnerabilidade está concentrada na África e no Sul da Ásia, afetando diversos países que já enfrentam situações nacionais difíceis.


CRIANÇAS: EDUCAÇÃO, SAÚDE E EXPLORAÇÃO

As crianças estão sofrendo com a pandemia em diversos aspectos. Em termos de saúde, além dos impactos diretos da pandemia, o Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde observou uma queda massiva nas taxas de vacinação em 2020, que regrediu para níveis observados pela última vez na década de 90 - ou seja, um recuo de 25 anos em cerca de 25 semanas.

Mas não é apenas na saúde que elas estão sendo afetadas. O fechamento de escolas a nível mundial está impactando 1.6 bilhões de crianças em 195 países, chegando a impactar mais de 60% da população estudantil de alguns países. Para lidar com essa crise, várias escolas no mundo inteiro estão transferindo suas atividades para ambientes digitais. Entretanto, esse cenário não está ocorrendo de forma homogênea globalmente: estudos indicam que mais de 826 milhões de estudantes não possuem acesso a computador em casa, 706 milhões não têm acesso a internet em casa e outros 56 milhões não possuem cobertura por rede móvel - a maioria em países e regiões mais pobres. Um exemplo comparativo da Europa e da Indonésia frente ao ensino digital pode ser visto na imagem abaixo.

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Os efeitos da interrupção da educação ainda devem provocar reflexos por muitos anos. Uma estimativa da OCDE indica que a ruptura escolar pode levar a uma perda de habilidades que resulte em uma queda de 1,5% na economia global pelo resto do século, e esse risco só deve aumentar quanto maior for o tempo pelo qual os estudos forem interrompidos. Um dos fatores que justificam esse número é o abandono escolar, pois muitas crianças acabam não voltando para a escola após surtos epidêmicos - um fato que parece afetar mais profundamente as mulheres. 98 milhões de garotas já não estavam na escola antes da pandemia e esse número pode aumentar em 20 milhões ao longo desse ano.

Um dos grandes riscos do fechamento das escolas em países de média e baixa renda é o envio de crianças para o mercado do trabalho. Sem as atividades escolares e frente a uma enorme crise econômica, muitas famílias passam a enviar seus filhos para o trabalho, em uma busca desesperada por dinheiro. As Nações Unidas estimam que ao menos 24 milhões de crianças deixarão a escola por conta da pandemia, com milhões delas ingressando precocemente no mercado de trabalho. A diminuição da fiscalização por conta da pandemia aumenta os riscos do trabalho infantil: uma boa parte das crianças acaba ingressando em trabalhos ilegais ou até mesmo perigosos. Novamente, as meninas aparecem sendo muito afetada, com o aumento, em países da África e da Ásia, dos casamentos forçados e da gravidez durante o fechamento da escola, com parte das jovens sendo forçadas a realizar trabalho sexual em troca de sustento para as suas famílias.


CONCLUSÃO

A pandemia da COVID-19 trouxe um desafio muito maior para a humanidade do que simplesmente uma doença. Além dos próprios números assombrosos de fatalidades e de sequelas provocadas pelo vírus, as consequências sociais e econômicas estão impactando bilhões de pessoas no mundo inteiro. Uma boa parcela delas, infelizmente, está sob alto risco, enfrentando não só o vírus, mas também a fome, a pobreza e a falta de oportunidades de estudo ou de trabalho. Por conta disso, é fundamental que analisemos e compreendamos a pandemia de 2020 em toda sua extensão - ou seja, como uma questão sanitária e também como um flagelo social. Somente dessa forma seremos capazes de elaborar os planos necessários de combate e de recuperação da pandemia, levando em consideração não apenas ações que visem combater a disseminação da doença, mas também que busquem soluções para os problemas socioeconômicos ressaltados e agravados pela crise.


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